Estádio do Sport Lisboa e Benfica 1954/2003
O dia 1 de Dezembro de 1954
é a data que assinala um dos maiores feitos da história benfiquista - a
inauguração do Estádio do Sport Lisboa e Benfica, popularmente conhecido por
Estádio da Luz.
Foi o culminar de um sonho
de muitos anos, após inúmeras iniciativas e actividades que movimentaram o País
e as colónias portuguesas, num esforço gigantesco que merece figurar na
história contemporânea de Portugal como um dos seus capítulos mais vibrantes.
Podemos classificar o
Estádio como um monumento erguido com a vontade de um povo! Após várias décadas
sem casa própria, o maior e mais popular clube português conseguia, finalmente,
um estádio à imagem da sua dimensão.
Logo que, em Março de 1944,
o Clube teve conhecimento de que a Câmara Municipal de Lisboa (CML) -
proprietária do Campo Grande, onde o Benfica jogava desde 05/10/1941 - estava a
estudar uma nova localização para o recinto benfiquista, começou a pensar-se na
ideia de construir um novo estádio. Porém, os anos foram passando e as Direcções
do Clube, eleitas anualmente, mostravam-se incapazes de obter, da CML, terrenos
para a edificação do novo campo. Alguns associados descontentes com a situação
são eleitos, a 19/01/1946, para a direcção, conseguindo, a 17/05/1946, um
encontro no Ministério das Obras Públicas, durante o qual o ministro eng.º
Cancela de Abreu se mostra interessado na resolução do problema, afirmando que
"o Benfica é de Benfica e para lá tem de voltar!".
Iniciava-se, então, o
processo que levaria à construção do estádio actual
Joaquim Bogalho tinha um
conjunto de princípios que procurava implementar. O estádio deveria ser feito
ao nível do melhor clube português, salvaguardando o seu pagamento imediato, de
modo a evitar empréstimos que hipotecassem novamente o futuro, como acontecera
com o estádio das Amoreiras havia dois decénios! É que, considerava-se, o
enfraquecimento do nosso futebol durante os anos 30 e 40 muito se devera aos
pagamentos de empréstimos para a
construção desse estádio, o que exaurira o clube ("esse cancro que corroía
a nossa existência; um tormento atroz.", nas palavras de Bogalho),
conduzindo à debilitação da equipa principal de futebol. Procuravam-se, assim,
terrenos amplos e acessíveis na cidade de Lisboa, bem localizados e onde se
conseguisse construir um "Parque de Jogos" que fosse ao encontro do
eclectismo do Clube.
Procurava-se, por tudo isto,
obter terrenos em condições vantajosas: topografia que facilitasse (e não
encarecesse) os trabalhos e a um preço acessível, já que o desejo não era arrendar
mas sim comprar - o que, para evitar encargos futuros, só viria a ser possível
em 21/10/1969. Quanto ao tipo de construção, o ideal seria um estádio sem
luxos, mas funcional, à imagem do Benfica, ou seja, um recinto desportivo com
uma capacidade de assistência aceitável para a massa associativa (40 000
lugares - o Clube registava 14 334 sócios em 31/12/1949) e erguido a partir de
um projecto que comtemplasse a possibilidade de ampliação futura. Depois de
delimitados os terrenos em Carnide - entre a estrada de Benfica, a rua dos
Soeiros e a azinhaga da Fonte (próximo do local onde estava projectada a nova
avenida circular de Lisboa) -, iniciaram-se as expropriações por parte da CML,
a 15/11/1949.
A elaboração do projecto do
"Novo Parque de Jogos" foi entregue ao arquitecto João Simões, antigo
futebolista do Clube, nas categorias inferiores, entre 1925/26 e 1929/30, que
teve a sabedoria de conceber um conjunto de recintos desportivos magnífico para
o estádio principal e para os espaços desportivos envolventes, uma obra
arquitectónica notável, que, apesar de concluída apenas 40 anos depois, seguiu
as "linhas gerais" definidas em finais dos anos 40 por João Simões, o
que enaltece a genialidade do projecto inicial. Já nos anos 50, iniciam-se as
campanhas financeiras que vão viabilizar a construção do estádio. A 27/10/1951,
surge a ideia de aumentar voluntariamente a quota de 16$00 para 20$00, dando
início à campanha "Fundos para o novo Estádio", que rapidamente tem
grande adesão por parte dos associados.
Mas é com a eleição da
Direcção presidida por Joaquim Bogalho, em 15/03/1952, que se incrementam
diligências para a construção do estádio.
Destas, destaca-se a criação
da "Comissão Central do Novo Parque de Jogos do SLB", encabeçada por
Joaquim Bogalho. A Comissão estimulou e desenvolveu variadas iniciativas e
coordenou ideias de outros associados, gerando-se um movimento imparável,
exaltado de benfiquismo e que permitiu o êxito das várias iniciativas,
devidamente publicitadas no semanário do clube, O Benfica. Após a Assembleia
Geral de 16/07/1952 ter autorizado a Direcção a assinar o contrato de ocupação
dos terrenos que a CML destinara ao futuro estádio do Clube, entrou-se num
período de euforia que só viria a dissipar-se com a inauguração do Estádio.
A visita à Estrada da Luz,
203, local dos terrenos do futuro estádio, determinou o lançamento da campanha
de donativos "O Primeiro Impulso", arrancando, desde logo, com 90
000$00. A escritura da cedência dos terrenos efectuou-se na CML, a 06/11/1952.
A área foi de 120 000 m2, sob arrendamento mensal de 1 500$00, passando, mais
tarde, em Julho de 1954, para 5 000$00, também mensais, mas sempre com a
perspectiva de aumentar a área envolvente e garantir a compra dos terrenos, o
que realmente viria a acontecer. Em Janeiro de 1953, as dádivas começam a ser
recolhidas no "Fundo de Construção do Novo Parque de Jogos do Clube".
Quando a 23/05/1953 é adjudicada a empreitada de terraplanagens, pelo valor de
840 000$00, contabilizava-se já, nos "Fundos Pró-Estádio", um total
de 1 355 658$00.
A inauguração oficial das
obras efectua-se em 14/06/1953. Numa primeira fase, o Clube desenvolve uma
intensa campanha para obtenção de
fundos: leilões diários na Secretaria, espectáculos pró-estádio, sorteios
monumentais e disponibilização de um mealheiro gigante no Pavilhão do Benfica
na Feira Popular. São levadas a cabo, também, algumas iniciativas de âmbito
cultural, como um concurso de cartazes e outro de quadras populares. O êxito
destas acções permite ao Clube guarnecer-se de recursos financeiros para os
trabalhos iniciais de terraplanagem do local, por onde vão passando milhares de
pessoas que não deixam de colaborar, pagando 10$00 por cada enxadada. Tudo isto
com a ajuda do jornal "O Benfica",
que reserva semanalmente as páginas 4 e 5 (centrais), com o título
"Pró-Estádio do Benfica", acompanhando o desenrolar dos
acontecimentos e das acções de angariação de fundos e noticiando e promovendo
novas iniciativas.
Com a multiplicação dos
Festivais Pró-Estádio em vários locais, dentro e fora do país, do Minho a
Timor, os trabalhos decorrem sem interrupções, em pleno clima de exaltação. A
30/01/1954, quando se adjudica a empreitada para as fundações das bancadas -
pelo valor de 542 330$00 -, havia nos "Fundos" um saldo de 2 336
825$48. Em simultâneo, inicia-se uma gigantesca "Campanha do
Cimento". Quando, a 17/05/1954, se inicia a construção das bancadas do 1.º
e do 2.º anel, adjudicadas por 5 968 000$00, regista-se um saldo de 2 078
400$48 e assinala-se a entrada no Clube de 9 327 sacos de cimento, correspondendo
a 467 toneladas. Em Outubro de 1954, foi criada a campanha "O Último
Impulso - Quem não deu que dê agora, quem já deu que torne a dar". O
slogan serviu para incentivar os donativos em dinheiro e cimento que se
prolongaram para lá da inauguração do estádio, permitindo a Joaquim Bogalho,
tal como era seu desejo, pagar o estádio - no valor de 12 037 683$65 - quando
deixou o cargo de presidente da direcção, após as eleições de 30/03/1957.
Inauguração do Estádio da
Luz
Finalmente, às 11 horas do
dia 1 de Dezembro de 1954, o emocionado líder do Clube, e maior responsável
pela passagem do sonho à realidade, Joaquim Ferreira Bogalho, abre
simbolicamente uma das portas de acesso ao Estádio, inaugurando um dos mais
belos recintos desportivos do mundo. O Recinto viria a acompanhar o futuro
crescimento desportivo e associativo do Clube. Originalmente com "dois
anéis", sem iluminação e isolado, seria mais tarde dotado de torres de
iluminação (1958), de um 3º anel construído em duas fases (1960 e 1985, permitindo aumentar a sua lotação para 70 000
e 120 000 pessoas, respectivamente) e de inúmeras infraestruturas desportivas à
sua volta. A 04/01/1987, por ocasião da 15.ª jornada do Campeonato Nacional de
1986/87, frente ao FC Porto, o Estádio da Luz registaria a maior assistência de
sempre: 135 000 pessoas!
O "efeito luz"
A importância da nova casa,
onde o Benfica dispunha pela primeira vez na sua história de um campo relvado
revelou-se logo na época da sua inauguração, com a conquista do título de
Campeão Nacional, que escapava desde 1950. Muitos clubes passaram então a
sentir o "efeito Luz", saindo, com frequência, goleados do majestoso
reduto. Que o digam alguns dos mais reputados emblemas do futebol
internacional, que sucumbiram, em jogos da Taça dos Campeões, ao efeito
terrível da "Catedral": 6-2 ao Ujpest da Hungria (06/11/1960), 5-1 ao
Áustria de Viena (08/11/1961), 6-0 ao campeão alemão, FK Nuremberga
(22/02/1962), e 5-1 ao finalista europeu de 1964, o Real Madrid (24/02/1965).
Em jogos com clubes portugueses, os exemplos são igualmente vastos: 9-0 ao
Boavista, para o Nacional (07/02/1960), 6-0 ao FC Porto, para a Taça
(30/04/1972), 5-0 ao Sporting, para o Nacional (19/11/1978) e 8-0 ao
Belenenses, para o Nacional (30/03/1980).
Entre outros, foi também na
Luz que o Benfica comemorou 23 (2 "bis" e 4 "tris" pelo
meio) dos seus 30 títulos de Campeão Nacional, o apuramento para 23 finais da Taça de Portugal (tendo 16
resultado na obtenção do troféu), 7 passagens à final da Taça dos Clubes
Campeões Europeus e a disputa da 2.ª mão da final da Taça UEFA, em 18/05/1983.
Tendo como referência a vitória 2700 do Clube (curiosamente, 2300 com
adversários portugueses), registada em 12/01/2002, data em que o Benfica
defrontou, para o Nacional de 2001/2002, o Varzim SC (3-2), já se tinham
jogado, até essa data, 1068 jogos no Estádio da Luz, desde a sua inauguração em
01/12/1954. A vitória 400 com adversários estrangeiros foi, também, conseguida
no nosso Estádio, a 05/08/2001.
No total de 1075 jogos
realizados, o Benfica somou 846 vitórias, 167 empates e apenas 62 derrotas,
tendo marcado 3121 golos e sofrido 692. Entre 02/03/1969 e 18/12/1973, o
Benfica registou a espantosa marca de 91 jogos consecutivos sem perder, com 80
vitórias e 11 empates. De assinalar, também, o registo fantástico de 37
vitórias consecutivas, alcançadas entre 01/12/1979 e 22/04/1981. O universo do
futebol jamais esquecerá aquele que é carinhosamente conhecido no mundo por
"stadium of light", um Estádio onde se disputaram alguns dos melhores
jogos de futebol realizados na 2.ª metade do séc. XX.
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