Campo de Sete Rios (1913 - 1917)
A ida do Benfica para Sete
Rios determinou a conquista de novos adeptos noutra área da cidade, bem como a
existência de espaço para introduzir no Clube novas modalidades: o Ténis, a
Natação e o Pólo Aquático. Em 1908, quando se soube que não havia capacidade
financeira para renovar o contrato de arrendamento na Quinta da Feiteira, os
dirigentes encetaram diligências com vista à resolução do problema. Mas só em
finais de 1912, muito por acção de Cosme Damião, foi possível alugar-se um
terreno (por 250$00 anuais, pagos em duas prestações).
Este terreno, de nome Quinta
Nova, pertencia à Casa Palmela, da qual Cosme Damião era o secretário. O
Benfica mudava-se, então, para um local onde o futebol dominava, já que, na
mesma área, existiam dois outros campos, ambos inaugurados com a participação
do Benfica: o de Palhavã, propriedade do SC Império (inaugurado em 29/10/1911,
com vitória do Benfica sobre o clube local, por 2-1) e o das Laranjeiras,
pertença do Internacional (CIF) - inaugurado em 01/12/1911.
Para a aquisição e adaptação
do terreno da Quinta Nova a campo de jogos, o Benfica fez uma subscrição
aberta, no Clube, para angariação de fundos. Alugado o terreno (em 01/01/1913)
- junto ao apeadeiro de Sete Rios, na linha de cintura interna dos
caminhos-de-ferro (com entrada pela Estrada de Palhavã) -, iniciou-se, desde
logo, o processo de preparação das obras, com a elaboração do projecto do campo
(ainda sem incluir bancadas) e com a
angariação de fundos especiais para fazer face à despesa extraordinária de limpeza e arranjo do terreno, tendo em
vista a sua conversão em parque desportivo.
O entusiasmo era grande
mas... o dinheiro escasseava
Era, por isso, necessário
conciliar estas duas realidades - começar a trabalhar praticamente sem dinheiro e, na medida dos possíveis,
procurá-lo com rapidez. Resolveu-se, assim, contar especialmente com o apoio
dos benfiquistas, não só no fornecimento de mão de obra, mas, também, através
duma subscrição de carácter voluntário, participando cada um conforme as suas
posses. O entusiasmo nunca faltou. Mercê dele, foi possível iniciar as
operações de arranjo do terreno, com o natural ensejo de o tornar melhor do que
todos os que já existiam em Lisboa. O lema foi: "para a frente!". E
poucos sócios faltaram à chamada.
Estatuto de mais popular
entre todas as agremiações desportivas portuguesas
Em pouco tempo,
transformava-se um terreno agrícola num amplo espaço, com um piso preparado
para dar lugar a um campo desportivo. A operação marcou uma fase de grande
estímulo no seio do Clube, que alcançara já o estatuto de mais popular entre
todas as agremiações desportivas portuguesas. Foi assinalável o esforço da massa
associativa - por meio do que mais estava ao seu alcance (o trabalho ou, mesmo
que pouco, o dinheiro). A circunstância deu origem a uma espécie de "febre
colectiva". Directores, atletas, sócios contribuintes, ou apenas
simpatizantes do nosso clube e das nossas equipas, todos se envolveram num
grande esforço de cooperação.
Em certos domingos, quase
não se parava ou descansava. De manhã, acarretavam-se pedras, arrancavam-se
plantas e cortavam-se arbustos; depois seguia-se o almoço popular, de
confraternização - geralmente uma "bacalhauzada" com batatas; mais
tarde, se alguma das nossas equipas jogava, dava-se a desfilada para o terreno
onde se efectuava o desafio; e por fim, no termo de mais uma jornada,
extenuados mas sem desfalecimentos de ânimo, lançavam todos a uma só voz:
"Viva o Benfica!".
Nas duas épocas que
intercalaram a saída da Feiteira (1911) e a inauguração de Sete Rios (1913), o
Benfica utilizou o campo de Palhavã (em 1911/12) e das Laranjeiras (em 1912/13)
para realizar os seus jogos "em casa", a contar para o Campeonato
Regional de Lisboa. E a verdade é que o uso de campo alheio não afectou o
desempenho da equipa, que conquistou dois títulos durante o período em questão.
Quando começaram os treinos de
preparação para a época de 1913/14, já foi possível utilizar o campo de
Sete-Rios. E foi com alegria e confiança que se aguardou a homologação por
parte da Associação de Futebol de Lisboa (AFL).
Em 12/10/1913, perante cerca
de 5 000 pessoas - número, na altura, muito pouco habitual em actividades
desportivas -, a AFL abriu a época de 1913/14. No jogo mais importante, para o
Regional de Lisboa, o Benfica recebeu e venceu o Sporting, por 4-0. O novo
campo causou mesmo algum pasmo, pela celeridade da sua construção e pelo seu
enquadramento: ao fundo do recinto de jogo, construíra-se um "chalé"
de madeira, estrategicamente colocado junto a uma nora, onde o Benfica tinha as
instalações de banhos e "toilette".
Finalmente um campo com
bancadas
Na sentido de facilitar e
alargar a acção da colectividade, sentiu-se a necessidade de introduzir no novo
campo todos os melhoramentos possíveis, em particular as bancadas (já antes
pretendidas para a Quinta da Feiteira), com vista a oferecer melhores condições
aos espectadores e aumentar os níveis de assistência. Para o financiamento,
optou-se pela emissão de 150 títulos de empréstimo (no valor individual de
10$00), adquiridos pelos associados. Em 11/04/1915, após o embelezamento de
todo o espaço, o Benfica, então com 11 anos de actividade, tinha finalmente um
campo com bancadas!
Em 29 de Maio do mesmo ano,
foi inaugurado o primeiro "court" de ténis, igualando-se outros
clubes elitistas que gostavam de exibir o seu "lawn-tennis", com a
particularidade de o espaço benfiquista ser de acesso a todos os associados. No
ano seguinte, aproveitando o antigo tanque de regas, introduziu-se a natação e
o polo-aquático no Clube! No futebol, o Benfica continuou a conquistar títulos
e torneios, mostrando cada vez mais que era o melhor clube português - 3
títulos regionais (13/14, 15/16 e 16/17), um Torneio "Taça de
Portugal" (13/14) e o Torneio Internacional "Quatro Cidades"
(15/16) - este último com uma vitória sobre o proclamado "campeão do Norte",
o FC Porto, por 9-0!
O Benfica conseguiu grandes
resultados neste campo. Rubricou uma série de 13 triunfos consecutivos (59-10
em golos); no total dos 38 encontros que aí disputou, venceu 28, empatou 6 e
perdeu outros 6; em matéria de golos, registou a excelente marca de 130 marcados
e apenas 40 sofridos, com destaque para o facto de apenas ter ficado uma vez em
branco (26/02/1916).
Abandono do Campo de Sete
Rios
Em 17/09/1916, definiu-se
com os Desportos de Benfica as bases para a junção de ambas as instituições,
tendo ficado ressalvado que, apesar da sede da Avenida Gomes Pereira possuir um
campo atlético (nas traseiras), continuar-se-ia com o campo de Sete Rios - por
ser mais central - até se apurar se os encargos dessa manutenção poderiam, ou
não, trazer vantagens. Sucedeu, todavia, que o senhorio, em 20 e 26/06/1917
(alguns meses antes de terminar o contrato de arrendamento), dirigiu duas
cartas à direcção do Benfica, pedindo a indicação do local, dia e hora a que
poderia ser recebido, com o objectivo de "combinar algumas alterações a
fazer no contrato para novo período de arrendamento, a começar em 1 de Janeiro
de 1918".
As alterações foram depois
escritas nos seguintes termos: a renda anual passava a 650$00; as contribuições
(mais de 40$00 por ano) ficavam a cargo do arrendatário; benfeitorias e obras
efectuadas, ou a efectuar, fossem de que material fossem, seriam pertença do
senhorio; o arrendatário ficaria obrigado a retirar, ou, pelo menos, espalhar
uniformemente, por todo o terreno, caso o senhorio o desejasse, o entulho que
se recebera no campo e que estava a formar a elevação do lado da geral; o
contrato seria por três anos, sem que o arrendatário tivesse direito a
indemnização no caso de o terreno, ou parte dele, ser expropriado pela Câmara
Municipal.
Estas condições foram
consideradas absolutamente inaceitáveis por todos os directores presentes na
reunião de 13/08/1917. Em 31 de Dezembro do mesmo ano, a direcção decidiu,
procurando resolver da melhor forma o problema que o senhorio criara, abandonar
Sete-Rios e remediar-se com o campo de Benfica, depois de convenientemente
adaptado. O último jogo realizou-se em 07/07/1917, com o V. Setúbal (V 3-2). O
Benfica mudava-se, então, para a Quinta de Marrocos, nas traseiras da Avenida
Gomes Pereira, onde possuía uma ampla sede desde 17/09/1916 (anteriores
instalações dos Desportos de Benfica)
Actualmente, o espaço de
Sete-Rios onde o nosso Clube jogou foi sacrificado à expansão urbana de Lisboa
para norte, estando ocupado por prédios e respectivos quintais, no quarteirão delimitado
pela rua Prof. Lima Basto (antiga Estrada de Palhavã), rua Dr. António Granjo,
rua Dr. António Martins e linha de cintura interna dos caminhos-de-ferro, junto
à estação de Sete-Rios. Após 4 temporadas de glória, o clube regressava
novamente a Benfica, recolhendo os "frutos da semente" que por lá
deixara, quando partira em 1911.
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